SINOPSE
PREFÁCIO: Sébastien Kiwonghi Bizawu
POSFÁCIO: Jaime Domingues Brito
Em uma sociedade complexa como a nossa, onde há uma imensidão de pensamentos, comportamentos, posições políticas e religiosas diferentes, natural que haja inúmeras questões polêmicas a serem solucionadas pelo Direito. Mas seria o Direito capaz de solucionar essas questões existenciais utilizando-se unicamente de seus instrumentos? Poderia ele dispensar o conhecimento produzido por outros ramos da sociedade, como por exemplo, no campo das Artes e da Literatura? Acreditamos que não. Neste ponto, Kelsen nos parece ter-se equivocado. Daí, a necessidade de quebras de paradigmas.
O Direito precisa evoluir, mas isso não significa que se deve isolá-lo das demais maneiras de se explicar o mundo, ao contrário, deve-se se aproximar delas, utilizando-as na árdua tarefa de interpretar os fatos e o próprio Direito para, depois aplicar a Justiça ou fazer acontecer a justiça, servindo-se, indubitavelmente, das Artes e da Literatura, e, sobretudo, quando se trata da arte de argumentação e da hermenêutica jurídicas.
O intérprete do Direito que desconhece a literatura é um jurista sem inspiração, no deserto da vida sem beber no manancial do mundo da sofia e da poesia. É imprescindível para o operador do direito compreender os valores da Justiça e aplicar o Direito, conhecendo os anseios e as aspirações mais profundas do ser humano, realizando-se, nesse sentido, mediante a literatura uma reflexão crítica sobre as desgraças e as contradições humanas, como diria Machado de Assis em seu clássico conto “A Igreja do Diabo”.
Compreender o Direito através da literatura é ser capaz de, por exemplo, entender o sofrimento de uma criança pobre através do olhar do personagem Zezé do livro “Meu Pé de Laranja Lima”, e apaziguar a fúria da lei no momento de aplicar a norma – seja penal, administrativa, civil, entre outras.
Devemos, sem sombra de dúvidas, superar essa forma tradicional de se estudar o Direito, aproximar a Arte do Direito, é o mesmo que aproximar realidades conflitantes na sociedade.
O Direito e a literatura devem andar lado a lado, se complementando, isso porque ambos são frutos da sociedade e junto com ela evoluem. Tratar o Direito como algo superior à literatura é o mesmo que dispensar parte daquilo que é a sociedade, é não ser capaz de compreender os valores inseridos no contexto social.
Sem dúvida, espera-se do jurista uma formação sólida, rigorosa, competitiva e pluridisciplinar que leve em conta os sinais dos tempos quanto a mudanças inevitáveis da sociedade em que vive no tocante a normas e jurisprudências. Daí, a necessidade da literatura para combater a frieza da lei a fim de provocar, no jurista, um repensar assentado no conhecimento holístico e humanístico.
Na esteira desse raciocínio é que se faz urgente que o operador do direito dê um grande passo no sentido de incorporar a literatura e a arte (em geral) na sua tarefa difícil tarefa de interpretar o Direito. Não há direito sem literatura e não há literatura que descaracteriza o direito em nome das diferenças que, na realidade, não geram desigualdades na arte de pensar, sentir, curtir e dizer o direito.
Prof. Dr. Sébastien KIWONGHI BIZAWU
Mestre e Doutor em Direito Internacional
Apresentação
A insustentável pureza da lei:
a interdisciplinariedade como elemento essencial da interpretação no direito
Nenhuma disciplina, de modo isolado, pode explicar tudo sobre determinado objeto; o desafio aumenta quando ela mesma se torna seu objeto. Diante dessas dificuldades o estudo interdisciplinar surge de forma promissora. A Arte oferece ao Direito novas possibilidades de compreensão, novos pontos de vista, sobre algum objeto, sobre o próprio Direito e ainda sobre o homem.
Hodiernamente, evidente é a importância da visão humanística do Direito. As expressões artísticas são manifestações propriamente humanas, e através delas observam-se as interações do homem com o meio. A Ciência Jurídica recebe uma infinidade de ferramentas para estudar fenômenos sociais, políticos, econômicos e históricos que influenciam as relações jurídicas; à parte esses fenômenos exteriores, a arte possibilita ao Direito um olhar pra dentro do humano, de sua psicologia, paixões, desejos, fraquezas.
Para além da contribuição humanística, o olhar o Direito por meio da arte é olhar um sistema encontrando-se fora dele. A interdisciplinaridade torna possível um olhar menos subjetivo, já que observador e objeto não se confundem; o Direito olha para si mesmo com ferramentas de outras disciplinas.
Quanto ao objeto a ser observado, a análise é enriquecida por ferramentas de diversas áreas, portanto torna-se uma análise mais completa, abrangente e mais próxima da realidade, pois com a ajuda de outros campos do saber o objeto pode ser contextualizado, não mais visto de forma isolada.
De autoria dos professores Alan Ibn Chahrur e Caio Henrique Lopes Ramiro, o trabalho inaugural da coletânea traz ao contexto do ensino do direito, problematizando primorosamente, importantes questões pedagógicas, especialmente ligadas ao ensino da filosofia do direito.
Por sua vez, o trabalho de Adolfo Prosdócimi e Ilton Garcia da Costa cuida da linguagem técnica cuja sofisticação muita vez dificulta a compreensão do cidadão comum.
Já o belíssimo artigo de Regina Vera Villas Bôas toma os versos de Cora Coralina no estudo da ciência e as disciplinas do Direito e da Ética da Natureza, a dispor ao leitor reflexões inter, multi e transdisciplinares, percorrendo distintos campos do conhecimento, inclusive o sociológico, o literário e artístico, entre outros.
Na sequência, Edgardo Torres, autor peruano, brindará o leitor com um belo passeio pela literatura e direito peruanos, conectados que se encontram também na América Latina.
Depois, o texto de José R. Seabra F., conhecido professor da FFLCH - USP, mediante o confronto entre os textos epistolares de Cícero e de Sêneca, expõe de modo muito erudito a literatura em cartas da antiguidade romana como gênero literário e de divulgação de filosofia moral.
A coletânea não olvidou de trazer à colação textos do medievo. A colaboração de Carlos Alberto Albertuni permitirá ao leitor interessantes ponderações sobre a questão dos primeiros princípios da ordem moral no pensamento de Tomás de Aquino a partir da compreensão da correlação entre os conceitos de lei natural e sindérese que integram sua concepção de racionalidade prática, não descurando de esclarecer como o conceito de lei natural é recebido no debate contemporâneo entre alguns intérpretes do pensamento moral de Tomás de Aquino, que se dividem em duas posições principais: os partidários de uma ética secundum naturam e os de uma ética secundum rationem.
Prosseguindo, a pesquisa de Aline de Menezes Gonçalves, Ana Luísa Moreli Pangoni e Rodrigo César Costa utiliza-se do conto A teoria do medalhão do maior escritor brasileiro do século XIX, Machado de Assis, para trazer as críticas à sociedade daquele tempo à do nosso.
De sua parte, Jefersson Campos e Luciano Ferreira Rodrigues Filho, com esteio em dois grandes autores Adorno e Bourdieu, relacionam política, televisão e cultura às questões de poder, dominação e opressão simbólica.
Em seguida, da grande obra "Morte e Vida Severina", de João Cabral de Melo Neto, o problema fundiário no Brasil a partir de belíssima perspectiva e com relevante resgate histórico.
Por fim, o atualíssimo e controvertido tema da fosfoetanolamina é tratado à luz do direito à saúde baseada em evidências e do livro "O rei das fraudes" de John Grisham.
Somos seres inacabados em busca de pontos de mobilidade interpretativa que nos levem ao desprendimento, aos nossos enigmas e simulacros. Não há dúvida de que o leitor encontrará nas páginas que o aguardam e desafiam muito a se deleitar.
Ilton Garcia da Costa
Rogério Cangussu Dantas Cachichi
Organizadores
Sumário
Capítulo 1
A FILOSOFIA SEM HISTÓRIA E A DESCONSTRUÇÃO DA REFLEXÃO NO ENSINO JURÍDICO 15
Alan Ibn Chahrur
Caio Henrique Lopes Ramiro
Capítulo 2
DIREITO, ARTE E LITERATURA: UM DIÁLOGO ATEMPORAL, CRIATIVO E NECESSÁRIO ATRAVÉS DA EDUCAÇÃO JURÍDICA...................................................................................41
Adolfo Carlos Rúbio Prosdócimi
Ilton Garcia da Costa
Capítulo 3
O DIREITO HUMANO FUNDAMENTAL AO MEIO AMBIENTE: DIÁLOGOS ENTRE O DIREITO, A ÉTICA DA NATUREZA E OS VERSOS DE CORA CORALINA 59
Regina Vera Villas Bôas
Capítulo 4
LITERATURA Y DERECHO JUDICIAL 75
Edgardo Torres López
Capítulo 5
EPISTOLOGIA - CÍCERO E SÊNECA. 91
José R. Seabra F.
Capítulo 6
LEI NATURAL EM TOMÁS DE AQUINO: A QUESTÃO DOS PRIMEIROS PRINCÍPIOS DA ORDEM MORAL 99
Carlos Alberto Albertuni
Capítulo 7
A ATUALIDADE DA CRÍTICA DA SOCIEDADE E DA COMUNIDADE JURÍDICA DO SÉCULO XIX EM A TEORIA DO MEDALHÃO 119
Aline de Menezes Gonçalves
Ana Luísa Moreli Pangoni
Rodrigo César Costa
Capítulo 8
DIREITO, MÍDIA E CULTURA: ADORNO E BOURDIEU ACERCA DA DOMINAÇÃO MIDIÁTICA 137
Jefersson Campos
Luciano Ferreira Rodrigues-Filho
Capítulo 9
MORTE E VIDA SEVERINA: CONSIDERAÇÕES ACERCA DAS RAÍZES DA DESIGUALDADE FUNDIÁRIA NO BRASIL E DO DIREITO FUNDAMENTAL DE PROPRIEDADE 151
Luma Gomes Gândara
Rodrigo Hiroshi Kakinohana
Capítulo 10
DIREITO À SAÚDE BASEADA EM EVIDÊNCIAS: O REI DAS FRAUDES’ DE JOHN GRISHAM
E A FOSFOETANOLAMINA 173
Diego Nassif da Silva
Luiz Henrique Néia Giavina Bianchi
Rogério Cangussu Dantas Cachichi
POSFÁCIO 195
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